Projeto de Lei apresentado pelo Deputado Henrique Fontana

21/08/2020 14:46

CD200862316500 PL Dispõe sobre a criação de um novo contrato de trabalho em plataformas digitais de transporte individual privado ou de entrega de mercadorias (1).pdf (405449)

 

Foi discutido no Coletivo Jurídico da CUT RS o projeto de lei elaborado pelo escritório do Dr Castro e apresentado da Câmara dos deputados vesando sobre a regulamentação dos trabalhadores em aplicativos, veja a exposição dos motivos :

 

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

                            A Revolução Tecnológica Microeletrônica desde fins do século passado vem alterando profundamente as formas de organizar e prestar o trabalho. Longe se vão os tempos das formas homogêneas de produção do taylorismo-fordismo da segunda revolução industrial.

                              O advento da internet e os enormes avanços da computação trazem agora o que se convencionou chamar de “ capitalismo de plataformas” . Este novo paradigma produtivo  se estabeleceu anarquicamente e os trabalhadores envolvidos em suas atividades não contam com praticamente nenhuma proteção social e/ou trabalhista. Reconheça-se, porém, que por suas especificidades e singularidades  não cabem dentro da regulação do vínculo de emprego estabelecida na CLT. São  novas formas de relação do trabalho que difere do vínculo contratual pensado e regrado para a produção fabril da segunda revolução industrial.

                            Mas isto não significa que não se devam estabelecer, em lei,  formas de proteção social e trabalhista , bem como de  inclusão previdenciária. Nossa Constituição prevê os institutos mínimos de proteção aplicáveis a qualquer que seja o tipo de relação de trabalho, a todos os cidadãos que trabalham , independentemente de tipo de vínculo.

                            Estas  novas formas de produção se caracterizam, como dito, pela crescente singularidade , não sendo socialmente desejável regulá-las de  maneira muito genérica. Reconhece-se, igualmente, que se caracterizam por ser relações de trabalho bastante precárias, exigindo que se estabeleçam com urgência as medidas mínimas de proteção supra citadas.

                            Optou-se, portanto, neste projeto, por criar um novo tipo de contrato de trabalho, vinculado restritamente ao trabalho em plataformas digitais de transporte individual privado ou entrega de mercadorias. E o  vínculo contratual, registre-se por essencial, se dá entre o prestador de serviço e a plataforma, não com o fornecedor , muito menos com o cliente adquirente. Não se aplica, porém, a trabalho em plataformas em geral, muito menos a uma generalidade de possíveis formas de organização e prestação de trabalho em ambiente digital. Cada novo tipo de relação de trabalho há de demandar sua própria regulação, bem como o incentivo à negociação coletiva entre os grupos sociais envolvidos.

                            A regulação deste novo contrato de trabalho busca seus parâmetros jurídicos e seus princípios na Constituição Federal e no conceito de Trabalho Justo ( fair work), desenvolvido pela OIT como o desdobramento do conceito de Trabalho Decente para o ambiente das plataformas.

                            O projeto , portanto, começa por afirmar os conceitos fundamentais que distinguem este contrato de trabalho dos demais: o trabalhador tem liberdade de escolher seu horário de trabalho, de conectar-se e desconectar-se quando quiser e não sofrer qualquer tipo de penalidade ou consequência remuneratória em face disto. A liberdade do trabalhador é base essencial do contrato de trabalho que se cria.

                            A empresa deve manter em seu portal as condições gerais do contrato, não pode alterá-las sem prévio aviso e tempo razoável e jamais em desfavor do obreiro. Deve assegurar o direito de defesa do trabalhador, previamente a qualquer punição. Outra questão essencial para este contrato de trabalho é o dever da empresa de explicitar previamente todos os elementos do serviço que oferece ao trabalhador (distância a percorrer, o endereço do destino e o valor líquido a ser pago pelo serviço) e o direito do trabalhador de recusar , também sem qualquer penalidade ou consequência remuneratória , o serviço que lhe foi oferecido. A empresa não pode, também, reduzir o valor que ofertou antes aceitação do serviço nem atribuir a responsabilidade ao trabalhador por viagem ou entrega frustrada por  causa de terceiros, muito menos reduzir de qualquer forma a  remuneração devida  por promoção ou desconto oferecidos nas entregas ou viagens.

 

                            O Projeto prevê  que o contrato se dá por tempo indeterminado, se formando com a aceitação do cadastro pela empresa e estabelece as maneiras  de  sua cessação, com o  pagamento das devidas indenizações.

                            O projeto garante uma renda mínima ao trabalhador, vedando a super-exploração que se verifica em muitas plataformas. Ninguém pode ganhar , líquido, menos que o salário mínimo por hora trabalhada, entendida esta como toda hora logada à empresa. Para o cálculo do valor mínimo a pagar incidem os adicionais de horário extraordinário a partir da 8ª hora diária e 44ª semanal.

                             O projeto assegura, anda, férias remuneradas e 13º salário, com um valor acrescido à tarifa básica e liberado ao trabalhador no momento oportuno.

                            O trabalho em horário noturno ou em domingos e feriados gera um acréscimo na tarifa , de 15%, revertido ao trabalhador.

                            Assegura-se a redução dos riscos à saúde , inclusive mental, garante-se o fornecimento de EPIs e de um seguro contra acidentes de trabalho, e restringe-se, por medida de segurança, as viagens e entregas a clientes previamente cadastrados na plataforma.

                            Para o transporte de passageiros , estabelece-se que o valor apropriado pela contratante não poderá exceder de 20% do valor total pago pelo cliente da viagem e o valor da tarifa inicial e o valor do quilômetro rodado não poderá ser inferior a 60% do cobrado pelo  táxi comum da cidade onde o serviço for contratado.

                            Inspirado na legislação do estado norte-americano da California , o projeto prevê que se verificadas as condições gerais que a CLT determina para o vínculo de emprego, este deve ser reconhecido, cabendo à empresa provar que estas não se verificam e definindo a caracterização da subordinação nestes novos tempos para o fim  do vínculo de emprego. O contrato de trabalho regulado no projeto demanda seu estrito cumprimento, sob pena de caracterizar-se o vínculo de emprego.

                            O projeto prevê o direito de organização , de greve  e de negociação coletiva, estabelecendo diversas regras que incentivam  sua efetivação, estabelecendo, ainda a competência da Justiça do Trabalho para dirimir os conflitos trazidos pela nova lei.

                       O direito à previdência social é uma garantia constitucional que deve alcançar a todos os trabalhadores, por força do princípio da universalidade da cobertura, respeitada a equidade na forma de participação no custeio. Nesse sentido, a Constituição autoriza o estabelecimento de modelo especial de inclusão previdenciária, destinado a viabilizar a proteção social.

                  A condição dos trabalhadores em plataformas digitais tem revelado a necessidade de estabelecer-se mecanismo de inclusão, que oportunize a obtenção de benefícios futuros, com patamares reduzidos de contribuição e, em contrapartida, limitação na contagem do respectivo período como tempo de contribuição, bem como no respectivo valor dos benefícios.

                   A filiação previdenciária permanece sendo na condição de contribuinte individual, contudo, observado como salário-de-contribuição os rendimentos recebidos em relação a cada contrato, possuindo como teto valor de dois salários mínimos nacionais. As alíquotas são reduzidas, sendo de 3% (três por cento) a cargo do trabalhador e 8% (oito por cento) do contratante, totalizando 11% (onze por cento), alíquota equivalente à do contribuinte individual de que trata o art. 21, § 2º, inc. I da Lei n° 8.212/91, parcialmente custeada pela empresa.

A reforma previdenciária eliminou a aposentadoria por tempo de contribuição, instituindo a cumulação de requisitos como tempo de contribuição e idade, bem como fixou tempos mínimos de contribuição para obtenção dos benefícios. A fim de promover a inclusão desses trabalhadores igualmente será considerado o respectivo período como tempo de contribuição, contudo, com limitação dos efeitos à obtenção de benefícios nos coeficientes de cálculo mínimos previstos pela Emenda Constitucional n° 103 de 12 de novembro de 2019, face à diferença no custeio.

É assegurado o seguro-desemprego para os trabalhadores , nos termos da legislação específica, bem como inclui-se o contrato de trabalho ora criado na legislação do PAT e do vale-alimentação , e se asseguram, ainda, benefícios fiscais para as empresas que concederem auxílios indenizatórios.

Como se trata de um trabalho reconhecidamente precário, contando com subsídios e subvenções sociais, cria-se uma a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE, com o valor de 5% (cinco por cento) sobre o faturamento das empresas, para auxiliar no financiamento destes benefícios.

E, por fim, cria-se o Conselho Nacional do Trabalho em Plataformas Digitais e Economia Colaborativa como órgão consultivo do governo federal para matérias envolvendo as plataformas digitais , para aprofundar um debate que está apenas começando.

Dr. Castro