Audiência pública no RS defende mais investimentos para atender vítimas da Covid-19

01/06/2022 11:21

 

Uma audiência pública na noite desta segunda-feira (30) deu início à cruzada a ser realizada pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul para verificar a situação dos gaúchos que convivem com as sequelas de infecções  causadas pelo novo coronavírus. Os participantes defenderam a necessidade de mais investimentos do Estado no Sistema Único de Saúde (SUS) para garantir atendimento eficaz às vítimas da Covid-19.

O encontro foi uma promoção conjunta entre o Fórum Democrático de Desenvolvimento Regional, por meio do Grupo Executivo de Acompanhamento de Debates (Gead) da Saúde, Educação, Cultura e Envelhecimento Ativo e Saudável, e a Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19.

Presidida pelo deputado estadual Pepe Vargas (PT), que tem formação médica, a Frente Parlamentar já agendou outros seis encontros nas macrorregiões da área da saúde no estado. Em junho, as audiências ocorrerão em Santa Maria, Lajeado e Pelotas. E em julho, em Passo Fundo, Santa Rosa e Caxias do Sul.

Conforme o parlamentar, o objetivo é escutar a população e fazer um mapeamento do impacto da pandemia na vida da população e no sistema de saúde e de proteção social das diversas regiões, tendo como foco o atendimento do SUS às vítimas e seus familiares.

Dar visibilidade às vítimas da pandemia e cobrar soluções

“Precisamos dar visibilidade às vítimas diretas e indiretas da pandemia e cobrar soluções efetivas do Poder Público para as pessoas que apresentam danos crônicos e permanentes. Além disso, temos que  ampliar o olhar para os impactos econômicos e sociais na vida dessas famílias e nas próprias políticas públicas”, apontou Pepe. 

 

“Existem demandas relacionadas à atenção à saúde da população que apresenta danos crônicos, permanentes ou temporários, causados pela doença, que implicam em novos arranjos assistenciais, ” destacou.

O deputado salientou que se soma a este cenário o aumento das “filas” por consultas especializadas, exames diagnósticos, procedimentos ambulatoriais e cirurgias eletivas – represados durante os períodos de restrição dos serviços de saúde.

“É preciso dimensionar, construir estratégias urgentes para alterar esse cenário de invisibilidade, desatendimento e sofrimento”, completou. Pepe lembrou ainda que os impactos da pandemia também são econômicos e a Frente Parlamentar também tem como propósito avaliar esses impactos.

A deputada estadual Stela Farias (PT) defendeu a destinação de recursos orçamentários pela União, estados e municípios para o enfrentamento aos danos causados pela pandemia.

Uma das ações imediatas da Frente Parlamentar será buscar o apoio da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa para a Resolução nº 013/2022, do Conselho Nacional de Saúde, que prevê a adoção pelo Ministério da Saúde de uma linha especial de cuidados para as vítimas da Covid-19. Também deverá costurar, entre os deputados estaduais, recursos orçamentários específicos para financiar o tratamento dos pacientes com seqüelas.

 

30% a 50% dos recuperados apresentam sequelas

Durante mais de duas horas, representantes de entidades da sociedade civil e sobreviventes do coronavírus falaram sobre as seqüelas da doença, dos sintomas da chamada Covid Longa e das dificuldades que enfrentam para conseguir atendimento.

O presidente do Conselho Estadual de Saúde e diretor executivo da CUT Nacional, Cláudio Augustin, é uma das vítimas da doença. Convivendo com seqüelas há mais de um ano, ele acusou o governo do estado de conduzir o setor da saúde “como se nada estivesse acontecendo”.

Augustin relatou que estudos de várias instituições nacionais e internacionais apontam que 70% das pessoas infectadas pelo coronavírus apresentam alguma sequela e 20% apresentam sequelas graves.

“Ocorre que de 30% a 50% dos recuperados apresentam seqüelas. Se tivemos dois milhões de infectados no Rio Grande do Sul, cerca de 700 mil apresentam danos. A maioria dessas pessoas não conta com qualquer tipo de assistências”, denunciou Augustin, salientando que o governo ignorou sugestões feitas pelos Conselhos na adoção de medidas de prevenção, de atendimento à saúde e instituição de protocolos.

A proporção de sequelados foi corroborada pela representante do Ministério Público Federal, Ana Paula Carvalho de Medeiros. Ela citou estudo da Fiocruz que aponta um percentual de 50% de sobreviventes com seqüelas por mais de um ano e uma lista com 23 sintomas que perduram mesmo após os pacientes serem considerados livres da infecção. 

 

Inexistência de orientação nacional

Representando a Associação Vida e Justiça, entidade que atua na busca de reparação para vítimas da pandemia, a médica Rosângela Dorneles criticou a falta de orientação nacional no enfrentamento da pandemia que ainda não acabou.e a ausência de medidas sanitárias para proteger a população. Ela alertou também para o “momento extremamente grave” no Rio Grande do Sul com a chegada do inverno e a lotação das UTIs, especialmente, as pediátricas.

“O sistema está fragilizado e fragmentado.  Faltam medicações, os trabalhadores estão exaustos e adoecidos e as filas não param de crescer”, advertiu Rosângela.

Segundo Rosângela, “a pandemia não terminou. Precisamos de medidas sanitárias firmes para proteger a vida da população, manter a recomendação do uso de máscara e garantir a vacinação de 95% da nossa população”, disse. “Estamos em um momento grave na saúde do Estado, temos ainda ausência de insumos e a dificuldade é grande para atender”, denunciou.

 

Falta de assistência para órfãos e enlutados

Já a fundadora e presidente da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico Brasil), Paola Falseto, chamou a atenção para outro aspecto da pandemia: a falta de assistência adequada para órfãos e enlutados. Ela criticou o abandono desse segmento por parte do Poder Público e sustentou que, mesmo depois da “tragédia que foi a pandemia", o estado continua sem fazer “ações de prevenção e promoção da saúde, que poderiam ter salvado milhares de vidas”.

Paola criticou também a falta de promoção e prevenção em saúde pelo Estado, o que é um dos princípios do SUS. “Se o executivo fizesse promoção e prevenção da saúde, com um protocolo nacional, muito dessas mortes não teriam acontecido, O Rio Grande do Sul é exemplo de abandono, precarização e ineficiente em saúde”, afirmou.

 

Covid Longa

A representante da Fiocruz Maria Juliana Moura Correa afirmou que, no próximos dias, a fundação lançará um informe sobre a Covid Longa para ajudar na identificação de alterações e na orientação de tratamentos e reabilitação. 

A falta de orientações e a necessidade de construção de uma linha de cuidado, de identificação, para o tratamento da população que vive com a Covid-19 prolongada é uma necessidade urgente, segundo a pesquisadora da Fiocruz. É preciso incluir a reabilitação física e funcional, apontou. 

“Tivemos inúmeros trabalhadores na linha de frente, considerados essenciais e que se expuseram sem vacina, essas pessoas ficaram sequeladas e há quem não conseguiu retornar ao trabalho”, alertou Maria Juliana.

A defensora pública da Defensoria Pública Estadual, Liliane Paz Deble, também criticou o Estado por deixar de atender sugestões de protocolos e demandas repassadas por entidades representativas, como a falta de leitos. “Quando o cidadão bate na porta da defensoria é porque tudo se agravou e, portanto, que dos nossos trabalhos surjam soluções”.

Já a promotora Gisele Müller Monteiro, do Ministério Público Estadual, ressaltou o trabalho do MP em busca da regulação e na melhoria do SUS, na tentativa de garantir o acesso à saúde.

A procuradora da República, Ana Paula Carvalho de Medeiros, apontou o estudo da Fiocruz o qual informa que metade da população infectada pela Covid-19 apresenta sequelas, com duração de, no mínimo, 1 ano. No entanto, segundo ela, não existe um protocolo nacional de monitoramento e de avaliação desses casos.

 

Garantir recursos do SUS para atendimento da população

Já o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Fernando Zasso Pigatto, disse que é preciso insistir com o Congresso Nacional no debate com o Ministério da Saúde, sobre a necessidade de garantir recursos ao SUS para o atendimento da população, pois a pandemia não terminou.

A enfermeira Inara Ruas, integrante do Conselho Estadual de Saúde e diretora do Sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul, salientou que por lei o governo do Estado, deveria investir 12% em saúde pública, porém, conforme ela, isso não acontece.

Inara lembrou o quanto a Emenda Constitucional 95 tem sido prejudicial à saúde e, diante disso, existe a necessidade urgente de sua revogação para existir investimentos. Ela também falou sobre a necessidade de identificação do número de vítimas que sofrem com as sequelas da Covid-19, bem como das patologias vividas por essas pessoas. “As estatísticas apontam quem morreu e quem sobreviveu e está recuperado”.

 

A Frente Parlamentar também ouviu vítimas da Covid-19, que sofrem com as sequelas da doença. Elas relataram o sofrimento vivenciado durante o período de internação e as dificuldades enfrentadas em conviver com as sequelas e na busca de serviços especializados.

Ewelin Canizares, do Movimento Inclusivas, contou que foi internada, teve embolia pulmonar, e hoje sofre com perda de memória, fadiga, além de problemas respiratórios. Ela ressaltou que em nenhum momento, durante a pandemia, houve um olhar para as pessoas c

Fonte: CUT-RS com Silvana Gonçalves e Olga Arnt – Assembleia Legislativa do RSom deficiência, que, em geral, sofrem com um número maior de comorbidades.

 

Na audiência, que também aconteceu sob forma virtual, estiveram presentes mais de 40 entidades representativas e instituições.